segunda-feira, 20 de dezembro de 2010


Menos Concursos e Mais Empresas

Manchete de um jornal de circulação nacional: “Não passou? tente outro concurso.” Um importante portal eletrônico traz no mesmo dia: “Concursos públicos oferecem 14,5 mil vagas em todo o país; pagam até R$ 19.643.” Tudo parece tão inocente e convidativo aos jovens deste País. Além disso, sem dúvida, concurso é inquestionavelmente a maneira adequada de o serviço público recrutar talentosos profissionais. Tanta verdade que esconde grande perversidade e desorientação educacional à nossa juventude.

Por trás dessa aparente contradição, revela-se o que pretende o País de seus jovens melhor preparados. Oculta o que é preparar profissionais para o futuro, um futuro que começa hoje. Preparar para concursos tem pouco a ver com enfrentar os desafios contemporâneos. Certamente os testes de ingresso, em geral de múltipla escolha, não conseguem captar características absolutamente relevantes de um profissional compatível com o presente e com o futuro. Assim, erramos no processo formativo e induzimos futuros profissionais, potencialmente bons, a reforçarem características e aptidões não relevantes.

Fruto dessa indução centenas de milhares de jovens se dedicam hoje à realização de concursos públicos. Mesmo quando aprovados em um deles, a maratona não se encerra nunca. Bastante comum assumirem e dedicarem-se em tempo quase integral a um próximo. É um sem fim de preparação, sem exercício pleno de profissão alguma. Se passam no executivo, assumem de olho num concurso do legislativo. Se com sucesso nos dois, há que se preparar ao do judiciário e assim por diante. O processo formativo reforça essa indesejável tendência e dela aferem lucros instituições que proliferam cursos preparatórios. São jovens talentosos mal orientados desperdiçando precisos tempo e dinheiro em atividades inócuas.

Diferentemente, o que devemos esperar de um profissional egresso de um curso superior é tudo menos o mesmo, se compararmos décadas atrás com os tempos atuais. Um grande complicador é que o que se espera atualmente, em termos de competências, inclui os requisitos de ontem, demandando, porém, novos importantes atributos, sem abrir mão dos anteriores. Um resumo de todas as mudanças está na diferenciação entre competências técnicas e competências múltiplas. Ambas igualmente importantes. Quando muito, em seu limite superior de eficiência, o concurso visa a captar limitadas competências técnicas.

O aspecto comportamental é absolutamente crucial quando um profissional depara-se com um problema inédito, um tema inovador ou tecnologias recentes. Se ao longo do período escolar, o qual é rigorosamente infindo, essas emoções, que preparam para enfrentar desafios, não foram trabalhadas, este suposto cidadão, ainda que dominando parcialmente as técnicas convencionais, terá enorme chance de fracasso. A competência de liderança dos futuros profissionais, a capacidade de trabalhar em equipe e de tomar iniciativa, a habilidade gerencial e a valorização do potencial criativo e da sensibilidade quanto ao ambiente em que estão imersos são atributos que raramente estão presentes nas avaliações, tanto dos estudantes de graduação como dos que fazem concursos.

Os estímulos às novas competências não menospreza o conhecimento tradicional e mesmo os procedimentos padrão de avaliação. Não se trata de substituir, mas sim de agregar. Ensinar não ficou mais simples, transformou-se em mais complexo, como a vida e o mundo do trabalho que nos cerca. Assim, se o que pretendemos é formar “concurseiros”, que permaneçamos fazendo o que temos feito. Caso contrário, que repensemos profundamente o que tem se praticado e subliminarmente estimulado nossos jovens a se constituírem. A nova mensagem de um Brasil que se pretende potência, com distribuição mais justa de oportunidades e renda, seria deixarmos claro o essencial: menos preocupação com concurso e mais estímulo a criarem suas próprias empresas.

Crédito foto acima: fotógrafo sueco Erixk Johanssen